segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

20/10/2007

INSUPORTABILIDADE

Recentemente, numa fila de check-in no balcão da GOL no aeroporto de Guarulhos ouvi um diálogo interessante.

Os funcionários da companhia aparentemente estavam envolvidos em uma “operação tartaruga”, cada novo passageiro que chegava ao balcão era atendido com uma morosidade que irritava àqueles que estavam aguardando.

À minha frente uma senhora com aparência cansada, seguramente com mais de setenta anos, comentou com a pessoa que estava a sua frente:

“Esta fila que não anda me dá uma saudade enorme da VARIG, no tempo em que ela era a principal companhia aérea do país as coisas funcionavam de maneira diferente”.

Resposta do passageiro à frente:

“Minha senhora, naquele tempo vivíamos num país diferente”. E mais não foi dito.

Nos últimos anos tenho escutado com freqüência comentários semelhantes aplicados a outros contextos:

“No Brasil as estradas eram ótimas, viajava-se de Porto Alegre a Salvador trafegando sobre asfalto em perfeito estado”.

“Quando alguém ficava doente era levado a um hospital público, o atendimento era bom e a população confiava na saúde pública”.

“Ao final da tarde costumávamos colocar cadeiras na calçada e conversar com nossos vizinhos, ninguém cogitava a hipótese de ocorrer qualquer ato de violência”.

“Os projetos de construção eram aprovados em trinta, no máximo sessenta dias. Ninguém cogitava a hipótese de pagar propinas aos funcionários da prefeitura para acelerar a tramitação ou assegurar qualquer vantagem”.

E por aí vai. A lista de comentários com teor semelhante é enorme.

Florianópolis não foge a esta regra, tal como outras grandes e médias cidades brasileiras possui um grupo considerável de habitantes que lembram (com saudade) do tempo em que ela era tranqüila e agradável.

Não faço parte deste grupo, conheci o melhor da cidade na época em que pensávamos que ela pouco iria mudar suas características; entendo as modificações ocorridas, faço parte do processo.

No entanto, há poucos dias me surpreendi ao lembrar uma matéria escrita no início dos anos 90 pela jornalista Monique Vandresen, no Caderno “B” do jornal “O Estado”. Em meio ao texto delicioso havia uma frase : “Afinal quem não tem sonhos de consumo ? Até eu, gostaria muito de possuir uma BMW branca ...... “.

Naquela época, quando a realidade da Ilha de Santa Catarina ainda correspondia aos slogans de publicidade dos órgãos de turismo, a imagem provocada por aquela frase levava a pensar naquele carro, com as janelas abertas, motor possante, correndo rumo às praias do norte sobre o asfalto de boa qualidade da SC-401.

O cenário mudou. A rodovia, que naquela época induzia a pensar em um passeio agradável, hoje está sobrecarregada com o volume de veículos que nelas trafegam, geralmente executando manobras para desviar de buracos e outras imperfeições.

O sistema viário de Florianópolis está no limite de sua capacidade.

Com a estabilização da economia e a restauração das linhas de crédito o volume de vendas de automóveis atravessou a fronteira do crescimento aritmético e passou para o campo do crescimento geométrico.

Tradução: numa cidade em que eram emplacados 1.000 veículos a cada mês, passamos a emplacar mais de 2.000 ao mês, cerca de 24.000 veículos a mais circulando nas ruas da cidade a cada ano.

Neste meio tempo, de 1997 a 2007 não foram implantados mais de 500 metros quadrados de novas ruas e/ou avenidas. O resultado é que a frota cresce e o sistema viário permanece o mesmo, os engarrafamentos passaram a fazer parte do cotidiano da “Ilha da Magia”.

A corrupção dos órgãos públicos encarregados pela fiscalização de obras permitiu que fossem executados prédios, além de estabelecimentos comerciais e de serviços, que suprimiram vagas de estacionamento e garagem.

A implantação de caminhos alternativos para as vias congestionadas foram inviabilizados por construções sobre as áreas destinadas ao prolongamento de ruas e avenidas. Órgãos públicos tomam posse e privatizam ruas sem qualquer reação por parte da população da cidade.

BMW branca ? Em Florianópolis ?Apenas um sonho de consumo do início dos anos 90.

Parafraseando aquele passageiro em Guarulhos : “Naquele tempo vivíamos em outra cidade”.

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